quinta-feira, 27 de novembro de 2014

Ruído de fundo

Da janela escorre luz,
Como tinta na água;

Sentado sobre o sofá
A assisto se misturar.

Afogado em claridade,
Meu burburinho se cala.

O silêncio sela a sala.

Iluminado e sombrio,
Escuto o mundo acordar.

terça-feira, 30 de setembro de 2014

Origami


Se, no papel do tempo, nós ousamos

Traçar as linhas do que planejamos;

A realidade sempre impõe sua norma;


E certo, o inesperado nos obriga

De algum modo a dobrar os nossos planos.


Ainda assim, nos resta algum controle.

Se não o que almejamos, impossível,

Ao menos pelas dobras que optamos:


Onde criamos arestas;

Quais pontas deixamos soltas;

Os pontos que nós ligamos...


Dessa forma, pelas nossas opções,

O que era plano ganha dimensões;

E a cada dobra a vida ganha forma.

sexta-feira, 26 de setembro de 2014

Purgatório.

Num canto inóspito
De mim, medito.

Nalgum momento
Invulgar, mas banal.

E não entendo
Nem me reconheço...

Estou só, mas cercado
por mim mesmo...

Sem saber expressar
Como me acuo.

       O sentimento que antecede a ausência...

       Como se sente uma bituca de cigarro?

E escrevo pra calar
O que não falo...

sexta-feira, 19 de setembro de 2014

Estudo II

Na semiótica do quarto

Vou desnudar tua semântica,


Brincar de metalinguagem

Pela extensão do teu léxico...


Até ficarmos sem palavras

E perdermos os sentidos.

Super cola.

De minha mão desastrada

Outro verso escorregou,

Porcelana delicada,

Nessa linha se quebrou.


Cato os pedaços e agrupo,

Como num quebra cabeça,

Arrumando os fragmentos

Numa estrofe improvisada

De disformes peças brancas,

Tentando em vão restaurar

A poesia quebrada...


Poemas são como vasos

Que pedem por conteúdo,

Sejam profundos ou rasos,

Querem se encher de sentidos.

Mas, melhor que os primeiros,

Não precisam estar inteiros.

Podem ser feitos em cacos

E ainda ser preenchidos.

terça-feira, 9 de setembro de 2014

São Pedro do lago

Canto de curva de mundo,

De árida beleza

E nome que evoca chuva...


Há mais vida que parece,

Se se deixar reparar

Para além dos balidos e sinos,

E do som compassado das turbinas,

Nos morros onde reina o vento,


Que canta pela ramagem

Da caatinga emaranhada

Dum jeito que balança a gente,

Como às flores que brotam no chão seco.

terça-feira, 2 de setembro de 2014

quarta-feira, 27 de agosto de 2014

Efeito estafa

Miragens no asfalto,

Meio dia.

Melancolia,

Calmaria

E ambrosia,

Distração doce,

Que amorna

O mormaço

Do que não faço.

sábado, 16 de agosto de 2014

segunda-feira, 4 de agosto de 2014

Paradósculo

Insensatez
Do desejo:

Quando um beijo
É fome de fala,

Consome as palavras
Nos lábios

Em busca da voz
Que ele cala.

domingo, 3 de agosto de 2014

Encanto

Todos sentidos
Em si.

Consciência,
Essa esfinge
Em tons de cinza.

Até que a música a tinge

Com a paleta agridoce
Das lembranças.


terça-feira, 29 de julho de 2014

Musa momentânea

Declama
Sua presença
De ritmo singular.

Se poema,
Toda prosa,

Na sua métrica
Arrojada.

Se expande
A cada gesto,

Para o tempo
A cada beijo,

Ao seu corpo
Une verso.

Epicentro do desejo.

segunda-feira, 28 de julho de 2014

Janela de ônibus

Papel crepom
Cor de chumbo
Embrulha o dia.

Rua encharcada,
Hora vazia.

Trânsito inchado
Entope as ruas.

Nada novo sob o céu.

O tempo cai
Como a chuva.

Promessas são de papel.

quinta-feira, 17 de julho de 2014

Amor?

Absurdo abstrato,

Autismo atencioso,

Avareza ao avesso,

Arroubo e arremate,

Alicerce da alma.

quarta-feira, 9 de julho de 2014

Retina

Num batimento
De pulso,

Na derrocada do dia,

Uma brisa
Amarelada

Palidamente estremece

O tapete
Dos jambeiros,

Fixando a cor na sombra...

terça-feira, 8 de julho de 2014

Primeiros socorros

Se algo te faz sangrar,
É preciso achar a calma:

Respirar; despir o hábito;

A inocência postiça;

A esperança movediça;

Acabar com a autofagia
Que só alimenta o medo...

Mas sem deixar-se estancar.

terça-feira, 1 de julho de 2014

Desmandamentos

Seja livre
Para decidir
[inclui desobedecer].

Rejeite
A formatação.

Mantenha
As portas abertas.

Não tema
As horas desertas.

Entregue-se
Quando lhe convir.

Ouça
Tanto quanto fala.

Lembre
Que é animal
[mas não como desculpa].

Perceba:

O incomum no banal;

A estranheza do normal;

A singeleza visceral
De um prato de sarapatel.


segunda-feira, 30 de junho de 2014

Sublime sangria

Semiconsciente, sonho:

Sensações sutis;

Suaves sussurros;

Súbitos suspiros;

Suor e saliva...

Saudade, sevícia.

quarta-feira, 28 de maio de 2014

Precisa-se caixas.

Trancado,
No quarto minguante,

Me vasculho
Como a uma gaveta,

Atulhada
De lembranças descuidadas:

Folhas, notas fiscais,
Coisas quebradas,
Mais montes de poeira,
Papéis gastos...

Afoito, tateio de qualquer jeito.

Me corto em algum caco
E então me fecho.

Preciso de faxina nesse peito,

Pra separar as coisas
Pra  mudança.





sexta-feira, 23 de maio de 2014

Toró-cadilho

Meu ano nublou
De janeiro a março.

Mal o tempo abril,
Já é fim de maio,

Época de chuva.


quarta-feira, 7 de maio de 2014

Predicados

Eu,  pronome
Sem tratamento,
De casos oblíquos,
Meio relativo,
Mas não possessivo.

Não pareço, mas sou
Um sujeito simples,
Embora às vezes elíptico...

quinta-feira, 1 de maio de 2014

Véu

A saudade
Que me assalta
Nessa tarde.

Inspiração controversa.

Que a guarde
Assim, imersa

Pelo canto das cigarras...



quinta-feira, 24 de abril de 2014

domingo, 20 de abril de 2014

Rito

A faca
Corta carne
E cartilagem
Até o osso...

A mão,
De grão em grão,
Separa o bom do mau...
Caroços de feijão.

O fogo,
Indiferente ao que
Esquenta ou queima,
Põe em ebulição.

A fome,
Ou pressa, impõe
Fechar a tampa
Da panela de pressão.


segunda-feira, 14 de abril de 2014

Casa vazia

Desgastada
Pela vida,

Sentada
Às margens do tempo,

Lenta e gradualmente

Cerziu
Os seus silêncios
Num delicado lençol.

Cobriu-se
De esquecimento.

segunda-feira, 7 de abril de 2014

Sanchos e Quixotes

Nem águas passadas,
Nem cargas montadas
Movem moinhos.

No entanto insistimos:

Ou boiamos rio abaixo,
Simplesmente...

Ou lutamos com
Gigantes invisíveis...

E grão a grão
Nos gastamos,
Do pó ao pó.

Sem nunca
Nos Percebermos
Farinha da mesma mó.

sexta-feira, 4 de abril de 2014

Pequeña verdad sin seriedad =P

Comunicación


No Hablo castellano,
Pero enrolo.
Como jacarandá
Mi rosto és duro.
Lo uso para hablar
Con los hermanos

Portuñol és la lengua del futuro.

Caradura

Candura,
Jaca dura,
Rapadura,
Água dura,

Nada dura.

Oh, vida dura...

sexta-feira, 28 de março de 2014

Tenho,
Entre outros
Atributos
De bruto:

Mãos grandes,
Dentes fortes,
Barba espessa.

E bem os uso
Pra fazer carinho.

quarta-feira, 19 de março de 2014

terça-feira, 18 de março de 2014

segunda-feira, 17 de março de 2014

Lembretes

Nunca se deixe engessar.

Arranje um bom par
De botas,
Confortável e resistente.

Não se prenda
A um destino,
Mas mantenha
A estrada em mente.

terça-feira, 11 de março de 2014

Estudo

Se te posso,
Sem decoro,
Te decoro.

Em todos sentidos,
Do fundo dos olhos
Às pontas dos dedos.

Quero te estudar
Até saber de cor,

Até te ter inteira
Na ponta da língua.

domingo, 9 de março de 2014

Espírito de vinho

Algumas vezes,

Se há um caldo emoções
Fermentado a algum tempo.

O coração, alambique,
No calor de um momento,

Gradualmente evapora
O mais volátil sentimento...

Que sobe à cabeça,
E condensa.

Destilado em lágrima.

sábado, 8 de março de 2014

Embaraço

Vendo assim, é engraçado.

Nossas barbas se emaranham
Sempre que beijo seus lábios...

Não é bem o que parece,
E se fosse, nada errado.

Só que minha barba é na cara,
E a dela em outro lado...

quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

Precipitação

Ao 

cair em mente

fértil, como a chuva 

sobre o solo. O silêncio 

entre as palavras, faz brotar

o entendimento daquilo que 

 não foi dito. Nem sempre 

acertado, admito.

sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

Centelha

Nas discussões solitárias
Das minhas horas sem paz,

Meu cachimbo, mesmo mudo,
É um orador perspicaz.

De coração inflamado,
Me dá conselhos sagazes
Com sua fumaça fugaz...

quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

Insônia

Não há calma,
Só silêncio.

Tenso e espesso
Feito argila.

Que aprisiona,
E quanto mais
A mente agita,

Mais se afunda.
Como areia movediça.





sábado, 15 de fevereiro de 2014

Exorcismo

Certas vezes
À noite, fica mais claro

Que na loucura é onde há razão,
E melhor me acompanha a solidão,
E a virtude é o pior dos vícios.

E eu me regalo, me embriago, me excedo.

Assim me mato pra ficar mais vivo.
Pois quando a dúvida é a única certeza,
Morrendo um pouco eu também mato o medo.





quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

Alerta aos leitores!

A literatura,
Laica e "leviana",
Legitimamente
Eleva a lucidez.
Louvando a liberdade,
Alicia "loucos e alienados"
A lerem livros lúbricos.
Leva à luxúria, à lascívia!
Ao aludir à liberação.

Logo vos elucido:
A leitura alimenta a libido.

terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

Alfômega

Arfa, arrepia
Beija
Concupiscente
Divinamente despida
Entrega-se
Feita fúria
Graceja, geme, goza
Histérica
Incontida
Jaguatirica
Lasciva
Morde-me

Nebulosa
Olhar oculto
Pelo pretume
Quintessencial
Reluz
Sutilmente
Transborda
Ubíqua
Volúpia viva
X
Zênite

quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

Cartilha

Cada corpo é um banquete
Para os sentidos convivas.
Aproveitem com deleite
As ocasiões festivas...

Tantas e ricas texturas
Para entreter o tato;
Sutis nuances de odores
Para educar o olfato;
Todas as formas e cores
Para a visão encantar;
Fala, ruídos, suspiros
E mais, para a audição;
Além de, tantos que são,
Sabores pro paladar.

Este é um pobre resumo,
Sem pretensão nem moral,
De incontáveis variantes,
Onde universal, presumo
É o fator consensual.

Só uma observação faço,
Que é de cunho pessoal,
Mas não deixa de ser fato:
Se refrear com pudores
É como cuspir no prato.

sábado, 18 de janeiro de 2014

Vento leste.


Salgada como suor.

Revolta, ampla, profunda.

Inconstante, mas perene,
Mutável como amar é.

Se rebenta feito vaga.

Insondável como a fé.

Minha alma sabe a mar.

terça-feira, 7 de janeiro de 2014

Cara ou coroa

Tempo,
Medida da insensatez,

Intangível e
Eterno presente,
Tira na sorte o futuro
Lançando ao alto
O passado,

Moeda imaginária
Antiga e fosca,
Que traz gravados
Nas faces gastas:
Saudade e
Remorso.